segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Natureza espiritual!

Do livro, "Karatê-Dō o meu modo de vida" (pag.67)

...Minha cidade nativa de Shuri é rodeada por colinas com florestas de pinheiros Ryukyu e vegetação subtropical; entre elas, está o Monte Torao, que pertencia ao barão Chosuke Ie (que, na verdade, veio a ser um dos meus primeiros patronos em Tóquio). A palavra Torao significa “cauda do tigre” e era particularmente adequada porque a montanha era estreita e tão densamente arborizada que realmente tinha a aparência de uma cauda de tigre quando vista de longe. Quando dispunha de tempo, costumava caminhar pelo Monte Torao, às vezes à noite quando a lua era cheia ou quando o céu estava tão claro que se podia ficar sob uma cobertura de estrelas. Nessas ocasiões, se por acaso também houvesse um pouco de vento, podia-se ouvir o farfalhar dos pinheiros e sentir o profundo e impenetrável mistério que está na raiz de toda a vida. Para mim, o sussurro era uma espécie de música celestial. Poetas de todo o mundo cantaram suas canções sobre o mistério da meditação que permeia os bosques e florestas, e eu era atraído pela solidão fascinante de que são símbolo. Talvez meu amor pela natureza fosse intensificado pelo fato de eu ser filho único e criança frágil, mas seria exagero de minha parte considerar-me um “solitário”. Apesar disso, depois de uma prática intensa de Karatê, não tinha coisa melhor do que sair e perambular sozinho. Então, quando estava na faixa dos meus vinte anos e trabalhava como professor em Naha, seguidamente me deslocava a uma ilha comprida e estreita na baía, que ostentava um parque natural esplêndido chamado Okunoyama, com pinheiros soberbos e um lago enorme de lótus. A única construção na ilha era um templo Zen. Aqui também eu costumava vir com frequência para caminhar sozinho entre as árvores. Por aquela época eu já praticava Karatê há alguns anos, e “à medida que aprofundava meu conhecimento da arte tornava-me mais consciente de sua natureza espiritual!” Usufruir minha solidão enquanto ouvia o vento assobiando por entre os pinheiros era, me parecia, um modo excelente de alcançar a serenidade da mente que o Karatê exige.

Gichin Funakoshi’O-Sensei