Ser educado, respeitoso,
esforçado, controlado, qualquer um em qualquer esporte pode se tornar uma
pessoa melhor, pode realmente ser um cidadão honesto e bem comportado na
sociedade, trabalhador e ser um bom pai de família, pode até ser um exemplo para
muitas pessoas. Qualquer um pode e deve procurar melhorar seus hábitos,
atitudes e explorar suas virtudes ao máximo.
Contudo, infelizmente uma das
grandes fraquezas humanas é “o ego”, e quando falo em “ego”, me refiro quando este
“comanda a vontade e se sobrepõem a razão”, contrariando a fundamentação das
virtudes essenciais do homem, e que o faz regredir em suas ações como ser
humano em detrimento dos demais, se alegrando, se vangloriando, se envaidecendo
com a derrota dos outros. Logo, caracterizando aí uma contradição, uma
hipocrisia enrustida em muitos “ditos esportes ou desportos de competição”,
assim como lamentavelmente o “dito karate esportivo” que hoje infesta e
corrompe a sua verdadeira doutrina.
Na Honorável Arte do Karatê-Dô de
O-Sensei’Funakoshi temos o Dojo-Kun (lema) e o Niju-Kun (princípios) para
orientar e nortear seus membros-praticantes de que forma devem agir e se comportar
em todos os momentos em sua vida, bem como a forma correta que a prática deve ser
conduzida, desenvolvida e considerada. Devendo assim segui-la em plena
conformidade com as determinações e conforme a linha ideológica e filosófica do
seu fundador.
E é aqui que se observa muito
claramente que nesses dois “rígidos códigos de conduta” sabiamente elaborados e
afirmados como “lei” num tradicional Dojo de Karatê-Dô, tanto no lema, nos seus
cinco apontamentos aclamados antes e logo após cada sessão de treinamento,
quanto nos vinte princípios fundamentais do Karatê-Dô de O-Sensei, que a
formação de um membro-praticante deve ser acondicionada diretamente e
objetivamente a sua forma de agir tanto dentro como fora do recinto de um Dojo.
E é ali que o “Caminho” se divide completamente! De
um lado a busca pelo conflito (a competição); do outro a Paz, a contenção do
conflito! Dois opostos, nos quais a grande maioria caminha de um lado para o
outro, sem absolutamente nenhuma definição real, muito menos fidelidade
incondicional, onde justamente deveria ser o “norte” do “Dô” do Karatê de O-Sensei!
Não se pode trilhar com lealdade,
legitimidade e comprometimento irrestrito por caminhos opostos! Hora em um,
hora em outro, isso demonstra uma forma de “ser e de agir” contraditória,
hipócrita, um comportamento que não tem nada em haver com o “Caráter” que se
professa e se espera no Dojo-kun de O-Sensei! Quem cultiva um espírito de Paz busca a Paz, jamais o conflito,
sem exceções!
Outro exemplo bem oportuno é a
prática do “Taikyoku Shodan”, ao mesmo tempo eu posso executar o “Taikyoku Shodan”
e encara-lo como parte do meu processo de estudo ou como uma simples forma de
aperfeiçoamento técnico nos meus treinos diários, ou mesmo como uma formalidade
eventual.
Porem, se eu realmente
compreender o seu significado e me prontificar em assumir o seu propósito, me
doando inteiramente, isto é, sem questionar, sem interferência pessoal, mas
simplesmente executá-lo, com sinceridade e me comprometer com o seu “ideal” e então
considera-lo e senti-lo simplesmente da forma original, como a legitima “criação
de O-Sensei” a cada vez que eu o reproduzo e dou vida a ele, e, portanto
torná-lo único por excelência, então estarei firme nesse ”Caminho”. Onde posso
sentir-me parte dele quando me encontro executando-o, não importando o lugar,
nem o ritmo, nem mesmo a condição ou de qual inspiração, simplesmente o faço
porque nele me sinto mais próximo do fundador e do que ele(O-Sensei) queria que
atentássemos de verdade, conforme a sua doutrina de pacificação!
E que assim, vivenciássemos a sua
Honorável Arte, bem menos destrutiva, mas muito mais construtiva, de
reencontros e descobertas interiores e por uma profunda gratidão pela
misteriosa e apaixonante razão de viver em harmonia com a gente mesmo e com os
outros, e que na prática diária isso se tornasse cada vez mais e mais forte,
com uma razão definitiva e determinada com um sentimento de realização interior
inigualavelmente autossuficiente em todos os aspectos que regem a nossa vida!
Logo o ideal é que um “Yudansha”
de Karatê-Dô de O-Sensei’Funakoshi seja um exemplo de unificação, de
compreensão, de responsabilidade e comprometimento com a origem da qual se
gerou a intenção de sua existência e do que motivou o seu fundador a dedicar
toda a sua vida a esta tão nobre missão!
Compreender como “principio” que
um “Tsuki” antes de mais nada é uma
extensão de uma sensação interior que ultrapassa a razão da matéria, esta muito
além, muito mais adiante, tanto dentro como fora da alma, se funde com o
passado e se volta para o presente com as mesmas emoções que um dia inspiraram
os genuínos sábios dos tempos antigos à revela-lo ao mundo, justamente o que
O-Sensei afirmou ter compreendido só no final de sua vida!
E assim dentro desta ótica,
abraçar a doutrina e se esforçar dia após dia para honrar as palavras que estão
gravadas no tumulo de O-Sensei ( “No Karatê-Dô não existe “agressão”!” ) e que
lamentavelmente volta e meia são anunciadas em muitos sites, blogs, redes
sociais, mas quase ninguém atenta, só comenta, mas não seguem ou cumprem em
nada tal conceito, é mera bajulação da hipocrisia popular em voga na “nossa”
sociedade! É o retrato do equivoco a que se transformou a interpretação da
prática do Karatê-Dô de O-Sensei mundo a fora!
Um “Yudansha” é “a essência”, e
como essência deve se comportar em qualquer lugar e em qualquer tempo da sua
vida, deve se ater aos “princípios e aos designíos” da Honorável Arte, assim
como O-Sensei queria que fosse, e que para bem poucos, mas para bem poucos
mesmo ainda o é e sempre o será!
Prof. Sylvio Rechenberg