domingo, 13 de setembro de 2015

A ARTE DE NAVEGAR PELO RIO ( Traduzido do original )

Comentários explicativos de Humberto Heyden’Sensei sobre a sua visão das claras diferenças entre competição e arte.

Muitas vezes, argumenta-se que o karate esportivo e o Karatê-Dô não são a mesma coisa, enquanto muitos argumentam o contrário. Gostaria de mostrar a minha opinião:

Imagine duas pessoas que gostam de viajar de barco ao longo de um rio. Ambos usam o mesmo barco, geralmente o mesmo equipamento e realizam o mesmo caminho por centenas de quilômetros, chegando ao destino. Isto tem sido feito por anos.

Ambos amam a sua atividade, e como amam a sua atividade, começaram a ensinar outras pessoas, tornando-as participantes naquilo que gostam.

Porem, um se reuniu a um grupo de pessoas e organizou um torneio, propondo o mesmo ponto de partida e o mesmo objetivo, que inicialmente era a viagem. Em seguida, a sua atividade tornou-se um sucesso e agora realiza torneios a cada ano e em diferentes temporadas do ano.E tornando-se um instrutor famoso, a quantidade de fãs que tem gerado é enorme. Todo mundo querendo competir para se tornar o primeiro a chegar no “objetivo determinado”.

Como o rio é perigoso, significa para estas novas gerações de remadores que devem aprender uma série de técnicas que requerem vários anos de trabalho intenso e assim dominando-as poderão vencer os demais. Diz-se que dominar as técnicas representa o domínio do homem sobre si mesmo,” mas” o seu objetivo é vencer os outros e se tornar campeão. Basta dizer que a aceitação social que isso implica é que muitos torcem para vê-los ganhar, se não fosse assim, que sentido teria? Embora, para muitos, qualquer forma vale a pena.

Um aponta para a popularidade, o exibicionismo, a ostentação, a aclamação, a celebração, a vaidade, a superficialidade. O outro aponta para o sentimento, o recolhimento interior, a harmonia, a integração com a natureza e, em alguns, êxtase, misticismo, contato com o divino.

Mas as pessoas originais eram duas. O que aconteceu com o outro?

A outra pessoa que gostava de viajar de barco ao longo do rio, ainda o faz e como adora a sua atividade queria também envolver outras pessoas. Tornou-se um instrutor e ensina como o outro, os segredos da arte de conduzir o barco descendo o rio.

Tem ensinado como desfrutar descendo o rio, de senti-lo, de vivencia-lo, além de todos os segredos técnicos para que isso possa ser realizado com o menor risco possível. Mas não ensina a competir, nem mesmo por casualidade. Só ensina como se deve ir descendo o rio ao longo das centenas de quilômetros da jornada.

Tal como seu colega, conhece todos os segredos do rio e da arte para conduzir o barco rio abaixo. Só que seu objetivo não é uma meta ou um resultado. Seu objetivo é a viagem em si, e durante o processo os alunos aprendem muito sobre o rio, sobre barcos e sobre si mesmos, mas talvez, no fundo não aprendessem nada, só tenham vivido e desfrutado, e que com este processo descobriram um mundo dentro de si mesmos, e assim também sobre tudo o que os rodeia. Eles aprenderam sobre si mesmos e sobre seus amigos, aprenderam sobre flora e fauna, aprenderam a viver um pouco mais.

Agora, ambos com idade mais avançada, ainda ensinam a muitos seguidores. Mesmo que eles se utilizem de equipamento similar, usem o mesmo barco, os mesmos remos e do próprio rio, muitos que os veem pensam que ensinam e praticam a mesma coisa. Mas isto é porque usam o mesmo equipamento e o mesmo rio.

Mas a verdade é diferente, e é tão diferente que não existe qualquer ligação entre as duas atividades, obedecem à realidades interiores muito diferentes entre si.

Um caminho é prático e utilitário e se transforma num caminho externo que precisa de títulos, prêmios, troféus, medalhas, etc. O outro é um “Caminho” não utilitarista, é emocional, é a integração, é um “Caminho” interno que aponta para a sensibilidade do homem e sua capacidade de ir fundo em encontrar o mais simples.

Eles são absolutamente opostos.

Um aponta para a popularidade, o exibicionismo, a ostentação, a aclamação, a celebração, a vaidade, a superficialidade. O outro aponta para o sentimento, o recolhimento interior, a harmonia, a integração com a natureza e, em alguns, êxtase, misticismo, contato com o divino.
Se alguém tem a experiência, como pode ensinar competição?

Humberto Heyden’Sensei


Julho 1, 1997