A graduação nas artes marciais: Vivemos em uma sociedade, ou melhor, em um mundo, que
valoriza a “aparência” das coisas, não importando o que se “É” e sim o que se
parece “SER”. Valores que outrora tinham um sentido intelectual e prático, ou
ético e moral, hoje já não importam, e é bem visto aquele que tem uma boa
memória e consegue decorar uma série de livros, ou ainda aquele que possui uma
boa oratória.
Dentro deste contexto, nos deparamos com um problema comum a
quase todas as artes marciais modernas: o fato de que hoje as pessoas têm
procurado as academias para praticar as diversas modalidades “marciais” em
busca da aquisição de uma faixa preta ou qualquer outra graduação que aos olhos
dos outros sejam sinônimo de “poder”, ou seja, buscam uma espécie de
valorização ou vaidade pessoal que nada tem a ver com o verdadeiro objetivo das
artes marciais.
São responsáveis por esta deturpação a maioria dos instrutores,
professores e “mestres” da atualidade que, com raras exceções, não se importam
com seus alunos e não querem saber o que eles fazem com os “ensinamentos” que
recebem. Estão sim, preocupados com o pagamento das mensalidades e com as taxas
cobradas para o exame de graduação, que é o motivo pelo qual dão aulas.
Porém, este não é um problema inerente somente as artes
marciais… estende-se a todas as áreas da pedagogia e irá persistir até o dia em
que as pessoas pararem de agir a partir de elementos externos e passarem a
exercitar suas tendências naturais, pois para que se possa realizar um bom
trabalho, em qualquer área, é necessário ter VOCAÇÃO. Aliás, deveríamos dar
mais atenção a este assunto, pois na vocação está a chave para a realização
pessoal e para a tão sonhada felicidade.
" Quando nos deparamos com a triste realidade de nosso sistema
educacional, chegamos à conclusão de que as atividades que deveriam ser
benéficas, como é caso das artes marciais, acabam prejudicando não somente o
praticante, mas também a imagem da arte praticada. "
Porém, se pararmos por apenas um instante para refletir
sobre a prática marcial, certamente chegaremos as seguintes conclusões: Não
basta ter socos, chutes e bloqueios fortes, precisamos também ter princípios
fortes; Não basta falar de coisas boas, precisamos e devemos praticá-las; Não
basta coragem para o combate é preciso coragem para enfrentar a grande luta da
vida, onde os desafios são diários; Não basta dominarmos nosso corpo e achar
que isto é suficiente para merecer uma faixa preta, devemos tornar “faixa
preta” nossa consciência e nosso coração, pois agindo desta forma pouco
importará qual a cor da faixa que ostentamos na cintura, até mesmo porque não
andamos uniformizados em todas as ocasiões de nossas vidas.
Todos os praticantes de artes marciais deveriam fazer
aumentar junto com sua graduação as suas virtudes, para que venham a se tornar
pessoas de moral, de bom caráter.
Portanto, somente é faixa preta aquele que, sem
preconceitos, busca o conhecimento e procura fazer dele uma prática diária;
Somente é faixa preta aquele que respeita a sabedoria eterna, seu mestre, seus
companheiros de treinamento, sua família e todos seus semelhantes; Somente é
faixa preta aquele que busca harmonizar sua personalidade efêmera deixando
assim transparecer, ainda que de forma distorcida, a beleza de sua alma;
Somente é faixa preta aquele que dedica sua vida para ensinar o pouco que sabe
aos outros, através de seu próprio exemplo; Somente é faixa preta aquele que no
meio da confusão moderna ouve a voz da sua consciência e se mantém fiel aos
valores que moveram, movem e sempre moverão os grandes guerreiros… ou como está
descrito na frase de alguém cujo nome não lembro, mas que jamais esquecerei as
palavras:
“Ser um autêntico faixa preta não é ser mais, mas se tornar
menos. Menos agressivo. menos vaidoso, menos autoritário, menos cobiçoso, menos
invejoso, menos egoísta, menos apegado, menos ignorante, menos violento,
menos…”
Denis Augusto Cordeiro Andretta